Capítulo 23
Na manhã fria de segunda-feira, Claire chega na gravadora ainda com aquele sorriso tolo nos lábios. Efeito colateral de um final de semana que ela queria que durasse para sempre. Assim que entra em sua sala, Rose entra atrás dela, eufórica.
– Claire, querida! Bom dia! Preciso falar urgente com você! – Rose se aproxima e dá um beijo no rosto de Claire que apenas sorri. Ela ainda estava um pouco extasiada pelo final de semana perfeito ao lado de Alex, então apenas espera para que Rose continuasse a conversa. – Você está com um sorriso bobo e bochechas coradas, querida! – Rose grita dando risada. – O que aconteceu de tão bom no final de semana, ham? – Ela se senta na cadeira em frente à Claire.
– Foi só um final de semana bom. – Claire estava enrolando nos dedos uma mecha de seu cabelo. – Com direito a carinhos, abraços quentes, pipoca, cobertor e muitos beijos. – Claire sorri e Rose dá risada novamente.
– Não me diga que você e o Alex… – Rose balança as mãos e Claire afirma com a cabeça. – Eu sabia que isso iria acabar assim! Fico muito feliz por vocês dois, minha querida! Assim quem sabe você esquece do seu ex namorado frustrado. – Claire se lembra das palavras de Matthew no dia anterior e se entristece. – Enfim! Claire, querida! Preciso que você me faça algo. Não poderei sair daqui durante essa semana, pois temos o trabalho com dois artistas novos que você nos trouxe, Alex e Juliette, e também temos a banda Stone Sour que está chegando amanhã para gravar algumas músicas de seu próximo disco.
– O que quer que eu faça, Rose?
– Preciso que você vá para Berlim. Tem uma banda nova lá. Eles acabaram de quebrar o contrato com a antiga gravadora e eu já havia conversado com o empresário deles. Disse que se isso acontecesse, eu iria querer trazê-los para cá.
– Mas por que eles já não veem para cá? Por que preciso ir buscá-los?
– O empresário quer conversar coisas de contrato e quer fazer isso lá. Eles são bons, mas preciso do seu veredito. Eles sabem que você vai chegar e eles sabem também que você irá avaliá-los. O contrato está pronto, mas só irão assinar se você disser que estão dentro dos padrões de qualidade da nossa gravadora. E eles são bem chatos. Preciso do seu discernimento para que eles não montem em cima de nós.
– Tudo bem. – Claire respira fundo. Não queria passar alguns dias fora, mas não via como escapar daquilo. – Quando devo ir?
– Já comprei sua passagem para amanhã depois do almoço.
– Quantos dias você acha que preciso para resolver tudo?
– Acredito que em 3 dias no máximo você define tudo. Claro, se eles forem aprovados por você. Portanto, não comprei sua passagem de volta. Mas assim que souber quando estará tudo resolvido, me avise que compraremos e te envio o voucher por e-mail. Ah, o hotel também já está reservado. Você ficará no Intercontinental. Reservamos 3 diárias, caso precise de mais, é só nos falar.
– Certo. Já que não tem jeito. Tudo bem.
– Ótimo, querida! Aproveite as noites lá para dar uma olhada nos bares de música ao vivo. Já me disseram que existe muita banda boa tocando na noite alemã. Me falaram dos bares que tem música ao vivo. Você pode encontrar tesouros por lá. Tem um bar que também é restaurante e uma balada. Se chama White Trash Fast Food. Vá nesse lugar. E bem próximo a ele, tem outro lugar que se chama Last Cathedral. É um pouco mais pesado, mas tem música boa.
– White Trash Fast Food. Last Cathedral. Ok. – Claire dá uma piscada para Rose. – Vou aproveitar bem meu tempo lá, Rose. Fique tranquila.
– Ótimo! Bom, nos vemos mais tarde. A Juliette deve estar chegando e o Alex vem hoje de tarde, certo? – Perguntou Rose enquanto se levantava da cadeira.
– Sim, ele me disse que marcou com você às 14 horas. E a Juliette me ligou sexta-feira, dizendo que um compositor estava querendo trabalhar com ela e disse que virá com ele aqui hoje. – Claire olha no relógio e vê que é pouco mais de 9 horas da manhã. – Eles devem estar chegando daqui a pouco.
– Vou pedir para prepararem a sala de reuniões, então. Nos vemos daqui a pouco. – Rose manda um beijo para Claire e sai.
Claire continua sentada pensando que não queria viajar. Ela tinha acabado de se acertar com Alex e seu pai ainda estava no hospital. Mas era a parte ruim de seu trabalho. Viajar em momentos inesperados e sem data certa para voltar, pois tudo pode acontecer em viagens assim.
Ela se lembra dos papéis que ela e Alex estavam rabiscando na noite de domingo e os pegou de dentro de sua bolsa. Espalha 4 folhas com desenhos e coisas escritas em cima de sua mesa e sorri ao ver os desenhos de Alex.
Amor e agradecimento.
Ela viu um desenho que Alex fez, tentando representar o dia em que se conheceram. A ponte Millennium, o rio marrom, um homem todo torto e ela mulher mais torta ainda. Os dois se olhando e os corações igualmente tortos saindo da cabeça dos dois. Ela riu e passou os dedos delicadamente sobre os traços que ele havia feito no papel. Ele também escreveu a frase “No primeiro olhar o coração congelou e depois voltou a bater forte, descompassado e totalmente insano. Está assim até hoje. Quero que fique assim até sua última batida”.
Claire puxou a folha onde tinha o seu desenho, onde ela havia se desenhado deitada na cama e de olhos abertos. Como ela havia ficado naquela noite, sem conseguir parar de pensar nele. Ela escreveu “Noites em claro apenas pensando se você também estava acordado. Se eu estava navegando pelas ondas de suas memórias”.
Na outra folha Alex escreveu “Eu já queria que você fosse minha, antes mesmo de escutar sua voz. Queria ser digno de poder lhe abraçar e colocar seus cabelos para trás de suas orelhas, quando alguma brisa marota bagunçar seus fios” e abaixo de mais alguns corações tortos que ele desenhou, estava escrito “Não vou poder parar de agradecer e fazer coisas para Deus, pois serei eternamente grato pelo melhor presente que ele colocou em minha vida: VOCÊ”.
Os olhos de Claire se encheram de lágrimas e ela sentiu seu coração se enchendo de amor e paixão. Todos os sentimentos bons que ela estava sentindo por ele. Ela rodou sua cadeira com uma folha na mão, a folha que ela havia escrito, e olhou para fora através de sua janela. As nuvens estavam espessas e caía uma chuva fina. O vento estava balançando as árvores ao longe. A catedral de St. Paul estava bem na sua frente.
Olhou para a folha e leu o que ela havia rabiscado. “Não tenho como agradecer. Aliás, acho que minha melhor forma de agradecer, será vivendo ao seu lado” e “Não consigo definir o que sinto, não consigo entender como tudo aconteceu tão rápido. Simplesmente fechei os olhos e pulei do abismo, rezando para que você me segurasse. E você segurou”.
O telefone de sua sala toca e ela, que estava completamente distraída, dá um pulo de sua cadeira com o susto. Ela estica o braço e atende a ligação. Era a secretária de Rose, que pediu que ela fosse para a sala dela, pois Juliette já estava subindo.
Claire demorou alguns segundos para guardar as folhas em sua gaveta e tirar o celular do carregador. Logo estava entrando na sala de Rose e assim que olhou para as pessoas que estavam lá dentro, quase caiu para trás. Rose estava com olhos esbugalhados e Claire sentiu todas suas forças desaparecerem.
Matthew estava com Juliette. Ele era o compositor que Juliette havia dito que queria trabalhar com ela. A pobre menina não fazia ideia de que ele estava apenas a usando para atingir Claire, para se aproximar novamente da vida de Claire.
– O que está fazendo aqui? Desde quando você conhece a Juliette? – Claire perguntou, se esquecendo totalmente de que era uma reunião de negócios e não uma discussão de relação. Ele não teve reação nenhuma e Juliette, mesmo sem entender nada, sentiu que o clima ficou pesado.
– Claire, sente-se ao meu lado. Vamos ver o que eles têm para nos mostrar. – Disse Rose, tentando apaziguar a situação constrangedora que havia se formado ali.
Claire cerrou os olhos com raiva. Tinha certeza de que Matthew estava apenas usando Juliette. Caminhou e se sentou ao lado de Rose, em seguida Juliette sem dizer nada também se sentou, depois Matthew, que estava muito nervoso e sentia suas mãos suarem frio. Ele estava nervoso de estar na frente de Claire novamente, depois de mais de um mês sem vê-la. Não conseguia tirar os olhos dela e não escutou quando Rose lhe perguntou sobre as composições.
– Oi, desculpa. Não ouvi. – Ele disse para Rose.
– Perguntei se vocês tiveram tempo para discutir sobre as composições. Se já sabem os temas que pretendem fazer as músicas.
– Eu quero muito que ele escreva sobre relacionamentos, mas de uma visão diferente. Quero cantar sobre como as mulheres conseguem ser fortes sem ter homens ao seu lado. – Juliette deu risada e Rose a acompanhou. Claire ainda estava de cara fechada. – Nós mulheres somos muito mais fortes do que imaginamos.
– Não tenha dúvidas disso, minha querida. – Disse Rose para Juliette e apertou os joelhos de Claire. Nitidamente pedindo que ela se envolvesse na conversa.
– Juliette, eu acredito que você deve se inspirar muito nos composições e melodias da nossa querida Amy Winehouse. Eu acho que você fará muito sucesso se for para essa linha do Blues mesmo. É a sua cara e sua voz fica maravilhosa nesse ritmo. – Disse Claire e Juliette sorriu assentindo. – Acredito também que as músicas devem falar sobre relacionamento sim, mas sempre procurando temas mais melancólicos, mais boêmios e mais trágicos. Será uma receita infalível se juntarmos sua voz, as letras boas e o blues.
– Será que você consegue me trazer dez músicas até o final da semana? – Rose perguntou para Matthew.
– Sim. Na verdade, já tenho duas aqui. – Ele disse. Puxou sua mochila para perto e tirou lá de dentro duas folhas impressas, com as letras que já havia escrito. – Mesmo antes de termos essa reunião, eu já achei que ela seguiria esse estilo musical e tomei a liberdade de escrever. Espero que esteja do gosto de vocês.
Ele coloca as folhas na mesa e Rose hesita um pouco em pegá-las. No final segura uma folha e passa a outra para Claire, que lê a música sem olhar para Matthew. Ela ainda estava séria. Enquanto ela lia com atenção cada palavra, Matthew passou o olhar por ela. Observou o detalhe de seu blazer de alfaiataria na cor azul claro, a camisa branca que aparecia por baixo dele e o foulard de seda cor de rosa escuro que estava enrolado displicentemente em seu pescoço. Ele se lembrou de um dia em que ela quase se enforcou sozinha tentando inventar jeitos diferentes de utilizar os cachecóis e foulards. Sentiu um aperto no coração e uma vontade imensa de abraçá-la.
– Essa letra está boa. Já imagino os acordes de saxofone e piano nesta música. – Disse Claire e sorriu olhando para Rose.
– Essa está boa também. – Rose passa a outra folha para Claire que começa a lê-la. – Bom, já temos duas letras para a avaliação das que entrarão ou não no seu disco. Se conseguirem nos trazer mais letras até o final da semana, podemos agendar mais uma reunião na sexta-feira.
– Terão suas letras, podem confiar. – Matthew disse com convicção.
Claire termina de ler a outra música e assente para Rose. Juliette sorri para Claire que retribui o sorriso. O celular de Claire começa a tocar e é uma ligação importante da cantora Adele.
– Com licença. Eu preciso atender essa ligação. É a Adele. – Claire diz para Rose. – Nos vemos durante a semana Juliette, venha amanhã para começarmos a gravar essa primeira música. – Claire pisca para ela e se levanta, olha para Matthew e sai com um aceno de cabeça, sem dizer uma palavra.
Enquanto está indo para sua sala conversando com a cantora, ela vê Dylan chegando daquele jeito que ela já conhece. Vê que ele vai para o estúdio e ele está sozinho. Ela conversa mais alguns minutos com Adele e assim que desliga o telefone, não pensa duas vezes e vai ao encontro de Dylan.
Ao abrir a porta do estúdio com certa força, ela assusta Dylan e vê que um pó branco cai das mãos deles. Eles se olham e Dylan fica meio desconcertado querendo esconder e disfarçar o que estava fazendo. Claire sente seu coração disparar de raiva e bate a porta atrás dela.
– Eu não dou a mínima para o que você faz fora daqui, Dylan. O que me preocupa é o estado em que você vem trabalhar e os erros que pode fazer enquanto estiver trabalhando. E principalmente o que você faz aqui dentro. – Claire diz, sendo muito dura com ele, que apenas a olha e respira de forma acelerada. – Não quero que esse seu vício interfira no seu trabalho e nas pessoas que estão à sua volta! – Ela mordeu os lábios que estavam tremendo de raiva. Deu mais alguns passos para ficar mais perto dele. – Dylan, você sabe que isso não vai te levar a lugar nenhum.
– Eu sei, Claire! Mas não consigo mais ficar sem. Mas olha, vou trabalhar sem errar dessa vez, eu prometo. Posso fazer tudo isso de olhos fechados. Sou muito bom no que faço. – Dylan se virou na cadeira e começou a mexer em alguns botões. Claramente descontrolado.
– Dylan! – Claire aumentou o tom de sua voz e ele parou tudo, a olhando novamente. – Vá embora. Vá para sua casa e só volte quando estiver bem. Caso isso não aconteça mais, que você não volte. – Ele abriu mais os olhos, incrédulo no que estava escutando. – Estou falando sério, Dylan. Vá embora.
– Desde quando você pode mandar alguém embora? Pensei que só a Rose pudesse fazer isso. – Ele se acomodou melhor na cadeira, querendo indicar que não iria embora.
– Sou o braço direito dela, você sabe muito bem disso. E eu me viro com ela. Tenho certeza de que ela faria a mesma coisa, para não correr o risco de comprometer a qualidade das músicas que serão gravadas hoje, por causa de você. – Ela abre a porta. – Vá embora. – Ela diz lentamente. Ele cerra os olhos e se levanta. Sua calça está com uma pequena mancha branca na coxa direita e ele respira fundo, pegando sua mochila e o celular. Ele para na frente dela antes de continuar seu caminho para fora do estúdio.
– Você vai se arrepender disso, Claire Thompson. – Ele diz entre dentes.
– Você está me ameaçando, Dylan? – Agora foi a vez dela cerrar os olhos. Ela o puxa para mais perto, segurando com força a gola de sua camiseta. Atitude que o assusta novamente. – É melhor você virar uma pessoa decente antes de querer se meter comigo, Dylan. Eu não tenho medo de pessoas como você e sei lidar muito bem com drogados descompensados. – Ela o empurra soltando a camiseta. – Vá embora, antes que eu mude de ideia e assine logo sua carta de demissão.
Ele bufava como um touro e vai embora, tão acelerado quanto chegou. Claire respira fundo e se encosta na porta, fechando os olhos e deixando a adrenalina que estava correndo por seu corpo, baixar seus níveis.
– Claire, está tudo bem? – Pergunta Sebastian, se aproximando da porta do estúdio. – O Dylan está indo embora? – Ele aponta para a direção onde Dylan havia acabado de ir e Claire abre os olhos e assente.
– Eu o mandei embora para casa. Ele não voltará enquanto não estiver bem. Já chega disso. É a segunda vez que ele chega nesse estado para trabalhar. Esse tipo de comportamento não será tolerado. – Ela cumprimenta Sebastian que estava sem reação.
– Concordo, mas… Quem vai me ajudar na gravação de hoje? Acho que não dou conta sozinho.
– Vou conversar com a Rose. Ela pode fazer isso com você. Vou contar o que houve.
Claire caminha coçando a cabeça e depois estalando os dedos. Ela apenas pensava que não queria Alex perto daquele homem. A situação estava começando a ficar insustentável. Ela sabia que Dylan poderia tentar atingi-la, persuadindo Alex. E ele o faria com o maior prazer. Apenas para mostrar seu poder para Claire. Ela abre a porta da sala de Rose e o vocalista da banda Bad Religion está conversando com Rose. Greg Graffin se vira e sorri para Claire. Mais uma banda que está negociando para gravar lá, graças aos contatos e estratégias de Claire.
Ela se junta à conversa e deixa o assunto de Dylan para mais tarde.